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[Vídeo] Evento - Paulicéia Literária 2016

A Paulicéia Literária, III Festival Internacional de Literatura de São Paulo, acontece de 15/09 a 17/09 de 2016 na sede da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP). Pela primeira vez, o evento será totalmente gratuito, sendo possível reservar seus ingressos no site desde 22/8. O autor homenageado nessa edição é Luís Fernando Veríssimo, que veio em pessoa participar da mesa de abertura ao lado de Humberto Werneck. A curadoria do evento fica nas hábeis mãos de Manuel da Costa Pinto (jornalista e mestre em Teoria Literária pela USP) e Manoela Leão (produtora cultural e formada em Artes Visuais pela Unespar-PR).

Assista o vídeo do nosso canal!

Em edições anteriores, a Paulicéia já trouxe para o centro da capital paulista autores de peso como Loyola Brandão, Valter Hugo Mãe, Scott Turow, Mia Couto, José Eduardo Agualusa e Leonardo Padura. Cabe salientar que esse evento está associado à existência do grupo de leitura Café Pauliceia, realizado mensalmente pela AASP, e que propõe um bate-papo descontraído sobre um livro e o seu autor. 


A partir das minhas muitas anotações sobre as palestras, faço abaixo um resumo dos principais pontos explicados nas Mesas de 1 à 5. Não faço essa seleção por elas serem melhores que as outras 6 mesas restantes, mas simplesmente porque, caso contrário, esse post ficaria extenso demais!

Mesa 1 - Autor em foco: Luís Fernando Veríssimo
c/ Luís Fernando Veríssimo e Humberto Werneck

São grandes nomes como Luís Fernando Veríssimo que lembram o público da importância da crônica, um gênero muitas vezes colocado de lado para dar espaço para o conto e o romance. Rubem Braga, por exemplo, passou quase a vida toda sem ter seu nome lembrado nas indicações aos prêmios literários. De forma bem-humorada, Veríssimo (escritor, saxofonista, roteirista, cartunista, humorista etc) conta que sua descoberta de si como cronista se deu ao acaso, depois de ser convidado a trabalhar em um jornal. Como leitor voraz, sentia familiaridade com as palavras ao escrever, apesar da inibição em mostrar os textos ao pai. Em sua formação leitora, foi influenciado principalmente pela literatura de língua inglesa e cronistas brasileiros. Comemora o aniversário em 26 de setembro.

O que é a crônica? Eis uma excelente pergunta... Trata-se de um gênero indefinido e que lhe dá a liberdade de escrever o que quiser e chamar de crônica. Rubem Braga dizia: crônica é o que não é aguda.

De onde nasce a crônica? De, literalmente, qualquer lugar. Não há rotina ou receita de trabalho; algumas levam mais tempo para serem escritas, outras não - muito depende do approach que pretende para com o texto. Sua musa inspiradora é o prazo de entreza, tal como diz Chico Buarque. Com exceção de Os espiões, todos os seus romances foram encomendados.

Mesa 2 - Ficção histórica e história íntima 
c/ Ana Miranda e Raimundo Carrero

O autor está e não está na sua obra. Raimundo Carrero é um sertanejo que escreve pela necessidade de tentar explicar quem e o que ele é, sem ignorar as coisas difíceis da vida. Sua obra é, por vezes, um carnaval com strip tese não recomendado para leitura. Diz curiosamente que queria ser um santo, apesar de saber que isso é impossível; e é essa impossibilidade que o escritor trabalha e trabalha para se tornar um escritor de verdade. Outra coisa impossível na sua obra é aparecer um personagem rindo: ao ser perguntado sobre a suposta ausência de ironia na obra, diz que o riso é a face mais cruel do homem e não a coloca em seus livros, pois como poderia um homem rir da desgraça humana? Ao citar outros autores, louva Ariana Suassuna e Machado de Assis com seu Dom Casmurro.

Para falar de sua vida de escritor, explica que tem um rotina estratégica e disciplinada, buscado escrever nos horários que determinou para si, nem mais, nem menos um minuto.

Já Ana Miranda enfatiza que personagens não são seres vivos, mas palavras. Eles vivem no sentido de que a autora os amava e tinha a impressão de andar de mãos dadas com eles - eis uma experiência humana, imaginativa e prova de amor pelo tesouro literário. Através da fabulação, experimenta o outro naqueles personagens que também são ela própria. O autor tem que ter intimidade com sua personagem e acreditar na sua existência para criar a verossimilhança. A literatura finge ser vida. Quando Ana escreve sobre personagens que viveram séculos no passado, tem a fantasia de voltar no tempo e se preocupa em usar palavras e expressões coerentes com o momento histórico que descreve.

Sobre seu processo criativo, afirma que as ideias estão no ar e costuma, por exemplo, anotar sonhos. Escreve como uma bordadeira que estrutura um tear de elementos significativos e depois perfuma, dando acabamento.

Mesa 3 - Anos de chumbo: ontem e hoje 
c/ Bernardo Kucinski e Julián Fuks

Com a aposentadoria e a decadência do jornalismo na universidade, Bernardo Kucinski começa a escrever ficção. Seu romance K: Relato de uma busca nasce a partir de contos ou episódios independentes que logo revelam sua relação entre si. A unidade nessa diversidade de capítulos autônomos e de formatos diferentes está na frequente aparição da figura do pai, K, que busca a filha desaparecida na ditadura militar brasileira.

Julián Fuks afirma que seu conto "O jantar" é uma resposta a impossibilidade de escrever e da busca por algo que se valha a pena falar contido no romance Procura do romance. No seu livro mais recente, A resistência, discute o exílio como herança ao ficcionalizar uma história do seu irmão adotivo durante a ditadura argentina.

Sobre a relação política e literatura, Fuks vê a literatura como resposta a tentativa de matar o espírito de esperança, a utopia e a luta política; mas Kucinski lembra que literatura não é mera ferramenta para atingir um objetivo.

Mesa 4 - Fantasmas da escrita 
c/ Cristóvão Tezza

Autor de livros como Filho eterno, Espírito da Prosa e O Professor, Cristóvão Tezza já afirmara que seus livros não são autobiográficos, mas sim ficções com personagens confessionais. O fato biográfico é o ponto de partida e nunca o ponto de chegada. Mesmo no processo de aquisição da linguagem ou no nosso dia-a-dia, as palavras já estão lá entre nós e o mundo pelo processo de representação. Um risco mortal do prosador é se colocar inteiramente confesso na obra, obviamente todo autor tem suas opiniões pessoais sobre x e y, mais isso pouco importa ao escrever o romance.

Filho eterno parte da sua experiência com Felipe (único personagem com nome no livro), seu filho portador da Síndrome de Down. Tezza demorou muito para encarar esse tema em suas obras, primeiramente, pelo impacto emocional que lhe trouxe e, segundo, por causa das diversas armadilhas e clichês que rodeavam o assunto. Já O Professor brota de sua carreira de 20 anos como professor universitário. O romance não faz referência a uma universidade específica ou em qual lugar do lugar estaria instalada. Por fim, A tradutora é um romance que será lançado ainda em 2016.

Sobre a profissão de escritor, afirma que é um caminho árduo, mas é possível viver da escrita. Escrever é construir um narrador, um ponto de vista sobre o mundo em 1ª ou 3ª pessoa (e qual escolher pouco importa). A ficção é, portanto, um modo sofisticadíssimo de apreensão da realidade.

Mesa 5 - Orientes próximos 
c/ Oh Sae-Young e Moacir Amâncio

O poeta coreano Oh Sae-Young, que veio para o evento financiado pela LTI Korea, afirma que poesia é uma religião sem deus, fazendo referência ao budismo. Todo ser busca a verdade, que pode ser de ordem lógica e objetiva ou subjetiva, intuitiva e contraditória (religião e poesia). Sem um deus absoluto, no budismo a busca pela verdade é interna, configurando-se na busca do verdadeiro eu. Menciona ainda o 1º versículo do Gênesis bíblico e interpreta que Deus não criou o mundo a partir do nada, como faz alguém que fabrica um brinquedo, mas sim deu significado (e, dessa forma, criou) as coisas do céu e da terra ao lhes dar nomes. Antes tudo era um caos sem nome, daí o grande ato de criação foi nomear. Pense que a morte de milhares de mulheres sem nome não significa nada para você em comparação a morte de uma única mulher chamada "mãe". Nesses termos, deus e o poeta são similares.

Lê seu poema A Tigela (veja o vídeo no canal!).

Moacir Amâncio, jornalista e professor de língua e literatura hebraica na USP, cita Harold Bloom (apesar dele próprio afirma não gostar desse teórico) ao falar que a poesia é uma religião que transporta. Discorda da cisão poesia e religião e cita o exemplo da cabala, onde a palavra possui importância fundamental. É um entusiasta da Torre de Babel e, a partir da citação de um filósofo israelense, a vê como um (re)encontro com o eu e a multiplicidade dos eus em si. É preciso perceber a torre de Babel em nós, basta lembrar de Fernando Pessoa, Rimbaud e outros.

Para encerrar, lê "Desencontro do poeta Dantas Motta ou o Anjo de Capote":


Fonte: Google Books

Para assistir as Mesas das edições anteriores do evento acesse o canal da Paulicéia Literária aqui.

By Geisy N.

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