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Filme - Vidas ao Vento

No original, Vidas ao Vento se chama "Le Vent se Lève", uma frase retirada do poema O Cemitério Marinho, de Paul Valéry. O verso completo diz: "Le vent se lève, il faut tenter de vivre", isto é, "O vento se ergue, é preciso tentar viver". Isto soa como uma afirmação melancólica de que aos homens só resta tentar viver neste mundo caótico. Afinal, o que fazer quando os sonhos são difíceis de se realizar? O que fazer quando descobre que sua amada esposa tem uma doença sem cura, a tuberculose? O que fazer quando seu país está em ruínas?


Último trabalho do diretor Hayao Miyazaki, que anunciou sua aposentadoria em 2013, o filme Vidas ao Vento é uma cinebiografia animada de Jiro Horikoshi, engenheiro responsável pela criação dos aviões de caça Mitsubishi A6M Zero, usados pelo exército japonês durante a Segunda Guerra Mundial, inclusive para o ataque a Pearl Harbor, em 1941. 

Jiro Horikoshi (1903-1982) foi um engenheiro aeronáutico japonês, projetista-chefe da equipe responsável por caças de grande sucesso na Segunda Guerra Mundial. 

Um A6M3 Zero Modelo 22 (NX712Z), recuperado na Nova Guiné em 1991 e mais tarde utilizado no filme americano Pearl Harbor, lançado em 2001. 

O primeiro sonho de Jiro. Ou seria o primeiro pesadelo? 

O filme começa em uma mistura de realidade e fantasia onírica. Quando criança, Jiro sonhou que voava em um avião em formato de pássaro e, como não podia se aviador por causa da miopia, decidiu dedicar toda a sua vida para criar essa máquina que vislumbrou na infância. Depois de devorar livros de aviação, ele terá outro sonho inspirador: dessa vez, conhece o grande engenheiro italiano Giovanni Battista Caproni, cujo avião, o Ca. 309 Ghibli, empresta seu nome ao estúdio de Miyazaki. “Aviões não são armas de guerra, tampouco um jeito de ganhar dinheiro. Os aviões são lindos sonhos”, diz Caproni, “E nós [engenheiros] transformamos em pura realidade.”

Jiro e Caproni se conhecem em um sonho. 

Giovanni Battista Caproni (1886-1957) foi um engenheiro aeronáutico, engenheiro civil e engenheiro elétrico italiano, além de designer de aviões e fundador da companhia aeronáutica “Caproni”. 

No filme, o engenheiro japonês é representado de uma forma inusitada e polêmica: Jiro não é um criador maligno do avião mortal, mas sim um artista consumido pelo desejo de perfeição, pela ânsia de criar uma máquina que voe à semelhança dos pássaros no céu e dos peixes no mar. Ele almejava, dessa forma, levar o homem às alturas, tanto no sentido literal como metafórico. 

Já a primeira cena é um microcosmo de todo o filme, ao retratar a dupla natureza do homem: de um lado, ele possui enorme capacidade criativa, por outro, tendências violentas e destrutivas. Afinal, para o que foram usados os aviões que Jiro finalmente foi capaz de criar? Para matar. O sonho de Jiro era também um pesadelo.

Jiro e sua futura esposa, Naoko, vítima de tuberculose 

O filme mistura ficção e fatos verídicos. Todo o romance de Jiro com Naoko, por exemplo, não coincide com a biografia do engenheiro. Parte do enredo é levemente baseada no livro The Wind Has Risen, de Tatsuo Hori, que se passa em um sanatório para tuberculosos em Nagano, Japão. Durante o longa-metragem também é citado A Montanha Mágica, escrito por Thomas Mann na mesma época em que sua esposa foi internada em um sanatório de Davos, Suiça, também por causa da tuberculose. Thomas Mann narra os problemas, inquietações e sofrimentos que acometem o engenheiro naval Hans Castorp num sanatório na Suíça, mostrando assim um painel não só da fragilidade humana, mas de uma Europa enferma, à procura de uma unidade.

Por fim, este longa-metragem é altamente poético e emocionante. É uma metáfora não só do fim da carreira de Jiro Horikoshi e do diretor Hayao Miyazaki, mas uma mensagem ao vento sobre a efemeridade da vida. Assim como o vento, a vida é as vezes tempestuosa, outra tranquila, mas sempre passageira. Cabe a você saber como usar o tempo que possui. “Você aproveitou seus dez anos?”, pergunta Caproni para Jiro. Sua arte e trilha sonora também são essenciais para criar essa atmosfera calma e onírica. Entretanto, infelizmente, a obra não irá agradar todos os gostos (afinal, possui 2 horas de duração e não é um blockbuster ao estilo pancadaria e beijos e explosões).

Diferentemente dos outros filmes do diretor Hayao Miyazaki, geralmente recheados de elementos fantásticos, Vidas ao Vento retrata a vida do personagem de modo realista, desde seus sonhos de infância até as tristezas da vida adulta, como o mundo do trabalho e da guerra, a vivência do primeiro e último amor. Indicado ao prêmio de melhor animação no Oscar, é o terceiro trabalho do cineasta a concorrer na categoria - após A Viagem de Chihiro, que ganhou em 2003, e O Castelo Animado, indicado em 2006.

By Geisy N.
Vidas ao Vento (2013)
Direção: Hayao Miyazaki
Produtora: Studio Ghibli
Música composta por: Joe Hisaishi
Gênero(s): Drama, Romance
Duração: 2h 6min.

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