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[Vídeo] Melhores Poemas: Cora Coralina

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Em uma tarde chuvosa de sábado, tive a oportunidade maravilhosa de participar do grupo de leitura Café Literário, promovido por minha amiga a educadora Janaina Soggia, na Casa das Rosas. Inspirada por esse encontro e na ocasião do aniversário da poetisa goiana, quero conversar hoje sobre o livro Melhores poemas: Cora Coralina (São Paulo: Editora Global, 2008).

"Dizia meu avô: / Quando as coisas ficam ruins, / é sinal de que o bom está perto.", afirma o poema "O longínquo cantar do carro". Cora Coralina, pseudônimo de Ana Lins do Guimarães Peixoto Bretas, foi mulher, goiana e guerreira. Sua poesia simples abrange o Brasil velho e novo, retratando desde a doceira na cozinha e a lavadeira cheirando a sabão até os cidadãos desvalidos, como as mulheres da vida. Brilham também em seus poemas líricos-narrativos a natureza (a terra, a pedra, o rio vermelho, a flor, o milho...) e os objetos simples (a muleta). 

Poesia é vida, é comunicação, é forma de recriação da vida, afirma Cora, e pode ser encontrada até mesmo no lixo. Sua receita é tirar do amargo o doce, fazendo sua poesia de ambos o suave e o duro, a alegria e a tristeza, a chegada e a partida. Cora Coralina é ela mesma a flor que brota da pedra, é a artista que esculpe na pedra rude os mais belos versos.

“Recria tua vida, sempre, sempre. / Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.” (poema "Aninha e suas pedras") Segundo Walace Rodrigues, outros autores famosos que fazem referências as pedras-poemas são Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e Fernando Pessoa (1888-1935). Primeiro, no trecho do poema drummondiano “No meio do caminho” mostra a figura suprema da pedra com toda sua força metafórica, colocando-se como um obstáculo ao ser humano que enfrenta dificuldades e também ao próprio texto que não consegue seguir em frente e falar outras coisas. Já o poema “Pedras no caminho”, de Pessoa, nos traz um olhar positivo em relação às pedras da vida: “Pedras no caminho? /Guardo todas, um dia vou construir um castelo…”, isto é, com as dificuldades me torno mais forte e construo fortalezas.Nota-se que as pedras podem ter significados diversos.

Por fim, a poesia de Cora Coralina traz inúmeras imagens, estimula sonhos, enriquece os sentidos e os saberes. Porém, tudo isto só é possível a partir das ressonâncias em nossos repertórios pessoais. A poesia pode ser uma arma poderosa de sensibilização, de compreensão de si mesmo e de uma língua e uma linguagem próprias. 

Das Pedras
De Cora Coralina

Ajuntei todas as pedras
que vieram sobre mim.
Levantei uma escada muito alta
e no alto subi.
Teci um tapete floreado
e no sonho me perdi.

Uma estrada,
um leito,
uma casa,
um companheiro.
Tudo de pedra.

Entre pedras
cresceu a minha poesia.
Minha vida…
Quebrando pedras
e plantando flores.

Entre pedras que me esmagavam
Levantei a pedra rude
dos meus versos.

A procura

Andei pelos caminhos da vida.
Caminhei pelas ruas do destino-
procurando meu signo.

Bati na porta da Fortuna,
mandou dizer que não estava.

Bati na porta da Fama,
falou que não podia atender.

Procurei a casa da Felicidade,
a vizinha da frente me informou que
ela tinha se mudado sem deixar novo endereço.

Procurei a morada da Fortaleza
Ela me fez entrar:

deu-me veste nova, perfumou meus cabelos...
fez-me beber de vinho.

Acertei o meu caminho.

O chamado das pedras

A estrada está deserta.
Vou caminhando sozinha.
Ninguém me espera no caminho.
Ninguém acende a luz.
A velha candeia de azeite
de lá muito se apagou.

Tudo deserto.
A longa caminhada.
A longa noite escura.
Ninguém me estende a mão.
E as mãos atiram pedras.
Sozinha...
Errada a estrada.
No frio, no escuro, no abandono.
Tateio em volta e procuro a luz.
Meus olhos estão fechados.
Meus olhos estão cegos.
Vêm do passado.

Num bramido de dor.
Num espasmo de agonia
Ouço um vagido de criança.
É meu filho que acaba de nascer.

Sozinha...
Na estrada deserta,
Sempre a procurar
o perdido tempo que ficou pra trás.

Do perdido tempo.
Do passado tempo
escuto a voz das pedras:

Volta...Volta...Volta...
E os morros abriam para mim
Imensos braços vegetais.

E os sinos das igrejas
Que ouvia na distância
Diziam: Vem... Vem... Vem...

E as rolinhas fogo-pagou
Das velhas cumeeiras:
Porque não voltou...
Porque não voltou...
E a água do rio que corria
Chamava...chamava...

Vestida de cabelos brancos
Voltei sozinha à velha casa deserta.

Meu epitáfio

Morta... serei árvore
Serei tronco, serei fronde
E minhas raízes
Enlaçadas às pedras de meu berço
são as cordas que brotam de uma lira.

Enfeitei de folhas verdes
A pedra de meu túmulo
num simbolismo
de vida vegetal.

Não morre aquele
que deixou na terra
a melodia de seu cântico
na música de seus versos.

By Geisy N.

Para saber mais:

Comentários

  1. Que post lindo!
    Amei as poesias!!! ����

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    Respostas
    1. Obrigada, Luana Alves! Sim, as poesias dela são maravilhosas!

      "Obrigado é muito pouco, presente não é tudo.
      Mas, o reconhecimento, isso! Sim, é pra valer...
      Meus sinceros agradecimentos por este momento." (Cora Coralina)

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  2. Descobri o blog pelo YouTube. Amei!!! Tem uma escritura com o título Decisão que dizem ser de autoria de Cora Coralina. Você conhece? Sabe em que livro da autora posso achar?
    Agradeço e abraços.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá, Sueli!!! Não há certeza se essa frase "Decisão" pertence mesmo a Cora Coralina... mas você encontrará o texto completo aqui: http://www.recantodasletras.com.br/artigos/3521034 Obrigada pela visita! :)

      “Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir.” (???)

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